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Lilases

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Já não há dedos ansiosos, Olhares atentos, cúmplices, Abraço, cheiro da pele, Urgência faminta do corpo, Gritos abafados, murmúrios, Risos, lágrimas E conversas descuidadas Já não vejo o jarro azul, Meio de água A escorrer no tapete desmaiado E a tal canção francesa A insinuar-se entre os lençóis, Adereço essencial de cena De amores (des)encontrados …E os lilases continuam mortos

Meu filho

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Muitas vezes te olhei nos olhos Onde escondias o riso, as mágoas E deixei as palavras secarem À espera do acordar da cidade, Onde caminhávamos sem sentido, Em fuga ao confronto, ao conforto, Meu filho, de alma atribulada, Fugido dos outros, de si próprio, Em desespero Filho protegido, protector, Capaz de enganos e abraços Amor de colo e sangue, Sempre em busca da alma Entre delírios de veludo e aço

Dor inesperada

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E a dor surge inesperada, Provocadora, insolente, Mar sem fim, nem fundo, Onda a crescer sem barragem que a contenha … E se perde todos os dias na corrente, Inunda, devassa e controla a mente Depois, é fogo num cristal de mágoa, A arrancar o sonho, a ignorar o desejo Esquecida, nunca morta, nas asas do silêncio Porque cheirava então a cidade a rosas ? Porque cheira agora a rua a medo ?

Memórias de Verão

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Que saudade tenho, De não ter cuidados, Ansiar o verão, os dias sem fim Os pés descalços a beijar a praia E o mar perto a cantarolar O olhar confiante e o amor bastante, Quase a ser demais Passeios à tardinha, cinema à noite, À luz do luar, com a manta às costas, Para não esfriar Dias que voltam à memória E embaçam os olhos, Mesmo sem chorar E no momento do tempo a fugir Só queria tempo para recordar, A menina que fui, com amor bastante, Quase a ser demais …

Hora

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Há uma hora das memórias Hora em que surgem abruptas, rebeldes, Torrentes de rio a moer ausências, Até à chegada do tempo derradeiro Hora que se finge branda, indulgente, Para de látego em punho castigar Quem abafa as lágrimas ou as chama Hora mágica, catártica, Que repele e embala como berço Sem colo nem manta, e depois Expulsa o ar e acaricia o medo H(ora) veludo, H(ora) lâmina, H(ora) tudo

Anseios

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Anseio os teus olhos, De ternura desmedida, A boca temerosa de palavras E a fome da pele nunca contida Anseio o riso franco de criança, As mãos generosas de carícias E o coração cheio dum futuro antigo, Até a hora ser de madrugar, A alma quebrar amarras, arrancar véus, O corpo vibrar em acordes inaudíveis E o abraço surgir firme e amplo, A trazer de volta a terra prometida E tu, fraco, manso, sem cuidados, A abraçar o sono, o sonho, Como no primeiro dia de vida

Alma solta

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Deixo a alma solta pelo ar, E o espírito brando, descansado Abro as asas, espero a chama, O odor da pele, o êxtase profundo, A ‘pequena morte’, que se estranha E entranha, breve como o fumo Depois, o aquietar dos sentidos, O despertar lento, a razão A voltar de outro mundo E as lágrimas silenciosas À procura da boca saciada Flores de lótus a emergir da água

Palavras que unem

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Com as palavras me perco e encontro a toda a hora Palavras fugidias, cativas, tuteladas As que defendo com honra e bravura porque pensadas no meio de outras mil, perdidas, descartadas Palavras minhas, cuidadas, que são bandeira, ombro amigo, amor perdido, amor achado Palavras que unem quem preza, quem confia, ou desconfia Escudos para qualquer espada As minhas sempre, de mão dada

Meu menino

Rosa de carne, Nascido frágil, impiedoso E nunca brando, Com gorjeios de cria a alimentar E braços contidos, asas de anjo, Cheiro a flor de mel, Sorriso entreaberto, tão perdido À espera sempre, de voltar a casa, Ao cálice profundo, á cisterna ardente, À semente Meu menino, nascido da vontade Tão desejado e querido, como água A fecundar a terra, a amansar o fogo Razão da vida, da voragem de ser E de ficar. Meu sangue, minha alma, alimento, Sol, Lua, vento singular Por ti guardo armas e segredos Afasto medos, desafio espadas E arraso vulcões apenas a olhar Meu menino amado sem limite, Que me faz sentir mais viva E me faz querer ser sempre mais

Dias

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Mil dias passaram, Desde que vesti negro e noite E me perdi no espaço Mil dias nevoentos, cabisbaixos Sem regaço capaz de suportar A dor da perda Casca de noz, jamais de aço E aqueles que mais amei, Para sempre fora do alcance Dos dedos, do abraço E o sorriso fechado, anulado A pintar de chuva o rosto Perdido da luz que teve um dia À espera do último encontro À espera de acertar o passo